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terça-feira, 12 de agosto de 2025

Adultização e normalização da exploração sexual infantil vem desde os anos 80


A adultização infantil, fenômeno em que crianças adotam comportamentos, aparência e responsabilidades típicos de adultos, tornou-se cada vez mais visível e debatida nos últimos anos e o debate está em alta após posicionamentos na internet. Influenciada por mudanças culturais, pela exposição à mídia e, mais recentemente, pelo impacto das redes sociais, essa antecipação de códigos e padrões da vida adulta levanta preocupações sobre efeitos na saúde mental, no desenvolvimento emocional e na construção da identidade.


De acordo com Higor Caldato (@drhigorcaldato), psiquiatra, especialista em psicoterapias, transtornos alimentares e obesidade. Sócio do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais), o que chama mais atenção é quando a criança começa a perder aquele jeito próprio da idade. Deixa de brincar como criança e começa a reproduzir poses, gestos e falas que são do mundo adulto, muitas vezes com conotação sexual. 


“É aquela menina de oito anos que já está preocupada se está ‘sexy’, ou o menino que imita atitudes que vê em vídeos, mas que não fazem sentido pra idade dele. É claro que se arrumar, escolher roupa, isso é normal… o problema é quando o valor dela passa a estar só nisso”, comenta. A American Psychological Association já mostrou que essa exposição repetida muda a forma como a criança enxerga o próprio valor, reduzindo a aparência física a um fator central.


Já a psicanalista e educadora sexual Marcella Jardim (@falaseriotia), pontua os sinais mais comuns de que uma criança está sendo adultizada, entre eles estão:


  • Uso de roupas e maquiagens sexualizadas de forma precoce.
  • Reproduzir falas, gestos e coreografias de teor erótico.
  • Ter acesso livre a músicas, vídeos e influenciadores com conteúdo sexualizado.
  • Pressão para “parecer mais velho” a fim de ser aceito socialmente.


Também segundo ela, o fenômeno da exposição precoce pode causar efeitos psicológicos, como:


  • Uso de roupas e maquiagens sexualizadas de forma precoce.
  • Reproduzir falas, gestos e coreografias de teor erótico.
  • Ter acesso livre a músicas, vídeos e influenciadores com conteúdo sexualizado.
  • Pressão para “parecer mais velho” a fim de ser aceito socialmente.


O psiquiatra completa ao explicar que o cérebro infantil está em construção, principalmente as áreas ligadas a julgamento, autocontrole, noção de limite. Quando a criança é exposta cedo demais a conteúdos sexualizados, ela não tem maturidade para entender aquilo. Isso aumenta o risco de ansiedade, depressão, comportamentos de risco e, pior, dificuldade para estabelecer limites saudáveis mais pra frente. Já vi, na prática, criança que começa a acreditar que só vai ser aceita se for bonita ou sensual. A UNICEF alerta que essa exposição precoce aumenta o bullying sexual e distorção de autoimagem.


Também a autoestima de uma criança deveria se formar com base em afeto, segurança e no reconhecimento das coisas que ela é capaz de fazer; e não na aprovação estética. Quando ela é adultizada cedo demais, começa a achar que vale só se atender a um padrão de beleza ou de comportamento. Isso mina a confiança, bloqueia o desenvolvimento de interesses e talentos. “Vejo criança que tem vergonha de brincar porque acha que é ‘coisa de bebê’. E pesquisas mostram que isso aumenta o risco de baixa autoestima e até transtornos alimentares na adolescência”, diz.


Crianças que crescem com essa influência tendem a reproduzir comportamentos sexualizados de forma inconsciente nas brincadeiras e interações, muitas vezes sem entender o real significado. Isso pode gerar situações de constrangimento, bullying ou até risco de abuso, já que esses sinais podem ser percebidos por adultos mal-intencionados.


Marcella vai além, e aponta que esses conteúdos moldam a ideia de que ser aceito e valorizado depende de estar dentro de um padrão sexualizado. Comerciais como o “Tio Sukita” e músicas como “Boquinha da Garrafa” ou “Senta no Colo do Papai” transmitem mensagens de erotização velada (ou explícita) que a criança absorve sem filtro crítico, influenciando a forma como enxerga o próprio corpo e o papel social que acredita precisar desempenhar.


Os especialistas argumentam que a mídia é uma das principais formadoras de opinião e referência para crianças e adolescentes. Ela tem poder para criar tendências e também para prevenir distorções. Representar crianças de maneira saudável significa respeitar seus direitos e seu estágio de desenvolvimento.


A Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU já prevê a proteção contra qualquer forma de exploração, e isso inclui a exploração sexual simbólica. Quando a mídia ignora esse cuidado, contribui para perpetuar padrões nocivos e até para aumentar a vulnerabilidade a crimes. Não é só uma questão estética, é uma questão de saúde mental e proteção infantil.


Algumas estratégias podem ser benéficas para os pais adotarem a fim de proteger os filhos da adultização e da superexposição na internet. Veja as dicas:


  • Supervisão ativa: saber quem são os ídolos do filho, o que ele assiste, ouve e segue nas redes sociais.
  • Educação sexual adequada à idade: ensinar sobre limites, consentimento e respeito ao próprio corpo desde cedo.
  • Filtros e controle de acesso: usar ferramentas de bloqueio de conteúdo impróprio.
  • Exemplo em casa: refletir sobre roupas, músicas e piadas compartilhadas no ambiente familiar.
  • Diálogo constante: conversar sobre a diferença entre realidade e entretenimento, ajudando a criança a interpretar o que vê e ouve.
  • Valorização de outras habilidades: incentivar atividades que desenvolvam criatividade, empatia e inteligência emocional, ao invés de apenas aparência física.


Marcella Jardim traz uma análise: “O livro Geração Ansiosa, que estou lendo, traz uma reflexão valiosa: ‘Brincar é o trabalho da infância’. É brincando livremente que as crianças desenvolvem habilidades sociais, cognitivas e emocionais. Quando são privadas disso, sofrem prejuízos que podem acompanhar toda a vida. Mas em vez de incentivar o brincar, vemos cada vez mais crianças envolvidas em rotinas, hábitos e até estéticas que pertencem ao universo adulto”.


“Um exemplo? Meninas de 6, 7 anos pintando as unhas, colocando unhas postiças, usando maquiagens elaboradas. Muitos pais justificam como “é só uma brincadeira” ou “para ela se sentir incluída no grupo”. Mas cada escolha assim carrega mensagens silenciosas sobre corpo, aparência e pertencimento. Mensagens que, somadas, podem abrir portas para comparações precoces, insatisfação com a própria imagem e vulnerabilidade diante de padrões inatingíveis”.


“E há um ponto que não podemos ignorar: você sabe quem são os ídolos do seu filho? Sabe o que ele ou ela está assistindo, escutando, consumindo? A cada vídeo, música ou conteúdo, existe um conjunto de valores e comportamentos sendo apresentados. Ignorar isso é deixar que outras pessoas e muitas vezes desconhecidas participem silenciosamente da educação e da formação de caráter do seu filho”.


“Não se trata de vigiar com desconfiança, mas de acompanhar com presença e consciência. Porque educar também é filtrar, orientar e mostrar caminhos. A infância não precisa ser acelerada. A infância precisa ser vivida. E o combate à sexualização precoce começa dentro de casa, com escolhas conscientes, diálogo aberto e coragem para ir contra a maré quando a maré não protege. Proteger não é privar… é preservar o que ainda é tempo de ser criança”, finaliza.



REFERÊNCIAS:


https://www.unicefusa.org/stories/not-object-sexualization-and-exploitation-women-and-girls-0


https://www.apa.org/news/press/releases/2007/02/sexualization


https://www.jusbrasil.com.br/artigos/publicidade-infantil-frente-a-adultizacao-da-crianca/1196954075


https://periodicos.ufac.br/index.php/psi/article/view/269/pdf_8


https://youtu.be/FpsCzFGL1LE?si=KGNq7vekfhec6lkX


FONTES:


Higor Caldato (@drhigorcaldato), psiquiatra, especialista em psicoterapias, transtornos alimentares e obesidade. Sócio do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais).

Médico psiquiatra pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ/IPUB), residência em psicoterapias com ênfase em Transtornos Alimentares e Obesidade também pela universidade carioca, através do Grupo de Obesidade e Transtornos Alimentares do IPUB e do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia (GOTA - IPUB/IEDE).


Marcella Jardim (@falaseriotia), sexóloga, educadora sexual, psicanalista e professora de filosofia.

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