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quarta-feira, 28 de junho de 2023

Três novelas de Yoko Ogawa

 

Título: A piscina / Diário de gravidez / Dormitório (Três novelas)

Autor: Yoko Ogawa

Tradução: Eunice Suenaga

ISBN: 978-65-86068-76-4

Formato: 14 x 21 cm / 168 páginas

Lançamento: 12/06/2023

Preço: R$56,00 

 

As três novelas do volume, cada qual a seu modo, tocam em dois temas caros a Yoko Ogawa: memória e ausência.

Em A piscina, a jovem Aya precisa lidar com o amadurecimento que a deixa entre a lembrança de um passado mais simples, que fica para trás, e o vislumbre de um futuro complexo, difícil e sofrido. Amadurecer será para ela conciliar os novos sentimentos e uma época em que “não conhecia a tristeza nem a dor no coração”.


Diário de gravidez, é narrada mesmo em forma de diário pela irmã da grávida. Yoko Ogawa usa a força da sugestão para gerar algo que a um só tempo existe e não existe — uma versão literária do gato de Schrödinger, por assim dizer. Várias entradas do diário descrevem uma gravidez que parece um delírio. Mas, se é mesmo o caso, quem será que delira: a narradora, a irmã ou os leitores?


Em Dormitório, uma mulher retorna ao dormitório universitário em que viveu durante os tempos de estudante, nos arredores de Tóquio.

O local, administrado por um estranho professor, aos poucos se deteriora e deixa de ser como a mulher recorda. Seu retorno é como o de alguém que vai à periferia de uma mente e lá encontra memórias que aos poucos desaparecem ou se transformam.


Sejam abelhas saindo de uma das milhares de aberturas de uma colmeia e entrando em outra, seja a água em muitas de suas direções — para cima com os respingos de um mergulho ou para baixo com uma chuva torrencial —, as imagens poéticas de Yoko Ogawa para representar a fluidez permitem que o ausente seja também presente e a memória, imaginação.

Yoko Ogawa nasceu em Okayama, Japão, em 1962. Sua vocação leitora foi despertada precocemente por clássicos infantis, graças a um sistema de assinatura de livros de que a família dispunha. Gosta de citar O diário de Anne Frank como uma referência decisiva para perceber a escrita como via possível e necessária de autoexpressão. Estudou escrita criativa e publicou diversos livros, entre ficção e não ficção. Vive atualmente em Nishinomiya, província de Hyogo — nas proximidades de Kyoto.


Arrebatou todos os prêmios referenciais do meio literário japonês. No Brasil, a autora publicou O museu do silêncio (2016); A fórmula preferida do Professor (2017), obra que foi vertida para o cinema pelo diretor Takashi Koizumi, ex-assistente de Akira Kurosawa; e A polícia da memória (2021), cuja tradução para o inglês foi finalista do International Booker Prize. Todos os títulos foram publicados pela Estação Liberdade.


trechos


“— O gancho se soltou — disse Reiko de súbito, como se falasse sozinha.

— Gancho?

— É — respondeu ela. — O gancho que prendia meu pai, minha mãe e eu se soltou. Já não tem mais conserto.

Como será que é o som de quando o gancho que une uma família se solta? Parecido com o som de quando as sementes da fruta se espalham? Ou como o de uma explosão quando produtos químicos provocam uma reação?” (A piscina, p. 30)

 

“Sim, sem dúvida o momento mais bonito de Jun era depois que ele saltava da plataforma até chegar à superfície de água, quando estava no ar. Tudo dele — as palavras e os gestos gentis — caía envolvido pela beleza de seus músculos. ‘É por isso que sempre fico te olhando na piscina’, murmurei dentro do meu coração.” (pp. 37-38)


“Doze semanas, ou seja, quarto mês de gravidez. Os enjoos da minha irmã continuam. Eles não a deixam, como se fossem uma blusa encharcada que gruda no corpo.

Como imaginei, minha irmã foi se consultar com o doutor Nikaido hoje. Os nervos, os hormônios e as emoções dela estavam à flor da pele.

Como sempre fazia quando procurava o doutor Nikaido, minha irmã gastou muito tempo para escolher as roupas que usaria. Estendeu vários casacos, saias, suéteres e echarpes na cama e ponderou com seriedade. E se maquiou com mais capricho que o normal. Será que meu cunhado não fica com ciúmes ao ver minha irmã fazendo isso? Fiquei preocupada.” (Diário de gravidez, p. 81)


“Comecei a sentir um aperto no coração. A palma da minha mão que continuava aberta foi ficando dormente e pesada. As gotas que não tinham para onde ir se encolhiam dentro dela.

— Talvez seja sangue — tentei falar em voz alta. Mas, por causa do som do bater de asas, não consegui ouvir direito minha voz.

“Sim, essa sensação é de sangue. Será que alguma vez já toquei em sangue tão fresco assim? Acho que o maior volume de sangue que vi até agora foi quando uma moça foi atropelada bem diante dos meus olhos. Eu tinha dez anos e estava voltando de uma pista de patinação no gelo. O sangue corria sobre os sapatos de salto alto, a meia-calça rasgada e o asfalto. Era viscoso e espesso. Como essas gotas.”

— Acorde, professor — chamei e sacudi seu corpo. A manta ficou suja de sangue. A gota de sangue caiu na ponta do meu chinelo. — Professor, acorde, por favor.” (Dormitório, p. 160)

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