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sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Julia Lopes de Almeida volta às prateleiras com A Intrusa e A Isca, romances que revelam sua força e atualidade

 

Obras escritas no início do século XX exploram a condição feminina, as convenções sociais e os dilemas morais — reafirmando Julia Lopes de Almeida como uma das grandes autoras da literatura brasileira

Dois títulos marcantes de Julia Lopes de Almeida (1862–1934) chegam novamente aos leitores: A Intrusa (1908) e A Isca (1922), publicadas pela Janela Amarela Editora. Escritos em momentos distintos da trajetória da autora, os livros reafirmam sua capacidade de transitar entre o drama íntimo, a crítica social e o olhar aguçado sobre o comportamento humano — temas que, mais de um século depois, permanecem atuais.

A Intrusa: a mulher e o moralismo da sociedade

Em A Intrusa, Julia retrata Argemiro, um viúvo rico e respeitado que, após jurar fidelidade à esposa em seu leito de morte, decide nunca mais se casar. Quando contrata uma jovem governanta para cuidar de sua casa e de sua filha, o convívio desperta tensões afetivas e desconfianças na sociedade conservadora do início do século XX.

Com uma escrita envolvente e olhar crítico, a autora expõe o peso das aparências e os julgamentos morais impostos às mulheres, discutindo o papel feminino, o luto, a fidelidade e a moralidade burguesa. Em tom sutil, Julia desmonta o ideal de virtude da época e revela a complexidade emocional de seus personagens — em especial das mulheres, frequentemente presas às expectativas sociais

A Isca: paixões, dilemas e o insólito

Publicado em 1922, A Isca reúne quatro novelas — A IscaO Homem que Olha para DentroO Laço Azul e O Dedo do Velho — que exploram diferentes aspectos da condição humana.
Na história que dá título ao livro, a fragilidade e a doçura da protagonista se tornam instrumento de manipulação, revelando com ironia a hipocrisia das convenções sociais. O Homem que Olha para Dentro mergulha nas angústias e vaidades masculinas, enquanto O Laço Azul apresenta um jogo de enganos e duplicidades envolvendo duas irmãs gêmeas. Encerrando o volume, O Dedo do Velho adiciona uma dimensão sobrenatural à coletânea, narrando a trajetória de um homem assombrado por uma mão misteriosa que o guia numa busca perturbadora.

Com ironia, sutileza e ousadia, Julia demonstra domínio narrativo e uma notável diversidade temática. Suas histórias combinam crítica social, psicologia e imaginação, oferecendo um retrato sensível e instigante de uma sociedade em transformação.

Uma voz feminina à frente de seu tempo

Autora de romances, contos, crônicas e peças teatrais, Julia Lopes de Almeida foi uma das figuras centrais da vida intelectual brasileira do fim do século XIX e início do XX. Defensora da educação feminina, do divórcio e da abolição da escravidão, escreveu para os principais jornais do país e foi uma das idealizadoras da Academia Brasileira de Letras — instituição que, à época, não admitia mulheres entre seus membros. Décadas depois, foi reconhecida pela Academia Carioca de Letras como patrona da cadeira 26, sendo a única mulher entre os 40 patronos

Sua literatura, marcada por personagens femininas complexas e pelo olhar atento às injustiças e contradições sociais, permanece viva por sua linguagem direta, crítica refinada e sensibilidade moderna.

Com A Intrusa e A Isca, o público tem novamente acesso a dois momentos essenciais da escrita de Julia Lopes de Almeida — uma autora que, mais de cem anos após sua estreia, continua a provocar reflexões sobre poder, amor, preconceito e liberdade.




Sobre a Janela Amarela Editora

Janela Amarela Editora nasceu durante a pandemia de Covid-19 com o propósito de resgatar obras esquecidas da literatura brasileira e apoiar autores contemporâneos. Criada por Carol Engel e Ana Maria Leite Barbosa, a editora aposta em edições cuidadosas, com ortografia atualizada e notas explicativas para termos em desuso, tornando clássicos acessíveis a novos leitores sem abrir mão de sua essência histórica.

Com A Intrusa e A Isca, a Janela Amarela conclui a republicação de todos os romances de Julia Lopes de Almeida, reunindo 17 títulos em catálogo — um feito inédito no Brasil e um gesto de reparação literária que devolve à autora o lugar de destaque que sempre lhe pertenceu.




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