Lançado pela Tulipa Editora, Oi, mãe, obra de estreia da escritora e atriz Alice Guimarães, é mais do que um romance: é um encontro com a própria trajetória de vida, marcada por dores e descobertas.
O título, simples e direto, reflete com precisão o tom da obra, que transita entre a memória e a ficção para apresentar uma narrativa de rara profundidade, ressignificando experiências que, embora pessoais, tocam questões universais. Este livro, ao mesmo tempo, é uma história de formação e uma reflexão profunda sobre os mistérios da mente humana, um relato emocional que, mais do que contar uma história, nos convida a refletir sobre a natureza da vida e das relações.
A escritora, ao enfrentar com coragem os meandros de sua memória, escolheu uma estrutura narrativa não linear que remete a um quebra-cabeça, a um caleidoscópio, onde os personagens e as épocas se encaixam e se reconfiguram ao longo da obra. Cada capítulo é como uma peça que, ao se juntar às outras, forma novas imagens, criando um quadro geral comovente e multifacetado. Essa escolha estilística é uma maneira eficaz de representar a complexidade da experiência humana, especialmente quando se lida com o peso de traumas e da saúde mental.
Alice Guimarães nos oferece um olhar honesto sobre sua própria história, marcada pela esquizofrenia de sua mãe, uma artista plástica que, antes do diagnóstico, expressava sua sensibilidade em belos desenhos a carvão. “Do Rio, me ficaram as lembranças dos sons, da luz, o calor das praias de Ipanema e Arpoador. E também as lembranças da minha mãe, artista que expressava sua sensibilidade em belos desenhos a carvão. Ficaram as marcas da nossa relação carinhosa, interrompida quando ela foi sequestrada pela esquizofrenia”, diz Alice ao refletir sobre o que permaneceu de sua infância e da convivência com a mãe antes da doença.
Foram quinze anos de diários e reflexões até que Alice se sentisse pronta para colocar suas memórias no papel. O livro, além de ser um relato sobre a esquizofrenia e os dramas familiares que dela decorrem, busca também celebrar a beleza das nossas vivências e a força do amor em meio à fragilidade humana. “Foram tempos difíceis, mas dessa vivência intensa e dolorosa ficaram muitas lições sobre amor, resistência e fragilidade humana”, afirma a autora, que encontrou na escrita não apenas uma forma de processar sua experiência, mas também uma maneira de compartilhar sua história com o mundo.
Em Oi, mãe, Alice Guimarães equilibra de maneira sensível a leveza e a dor, a tentativa de explicar o inexplicável, e, ao mesmo tempo, a celebração da vida, por mais complicada que seja. Sua escrita é uma forma de “mergulhar na memória e na alma”, como ela mesma diz, e ao fazer isso, ela nos convida a refletir sobre os traumas, mas também sobre as formas de resiliência que carregamos. A obra de Alice é, acima de tudo, uma reflexão sobre como a arte e a literatura podem ser ferramentas fundamentais para dar sentido ao que parece insensato e para entender o impacto da saúde mental na vida de uma pessoa e de uma família.
Oi, mãe é uma obra emocionante que transcende a experiência individual da autora, oferecendo aos leitores uma janela para a complexidade das relações humanas, para o mistério da mente e para a beleza das memórias que nos moldam. Alice Guimarães, com sua escrita delicada e penetrante, nos entrega mais do que um livro: ela compartilha com a gente um pedaço de sua alma, um testemunho de dor e amor, e uma reflexão sobre o impacto da esquizofrenia em sua família, mas também sobre a capacidade humana de resistir e seguir em frente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário