Tatiana Naumann, especialista no atendimento a vítimas, destaca que ampliação é um avanço essencial para a igualdade de direitos
Em decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou, por unanimidade, que as proteções previstas na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) sejam estendidas a casais homoafetivos masculinos e a mulheres transexuais e travestis. A medida visa suprir a lacuna legislativa existente e assegurar que todas as formas de violência doméstica sejam devidamente combatidas, independentemente da orientação sexual ou identidade de gênero das vítimas.
Em uma ação na Corte, a Associação Brasileira de Famílias HomoTransAfetivas (ABRAFH) apontou que há uma deficiência na proteção de outras relações afetivas e familiares. O caso foi julgado no plenário virtual e concluído nesta sexta-feira (21). A maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes.
A advogada Tatiana Naumann, especialista em Direito de Família e em casos de mulheres vítimas de violência sexual, avalia que a decisão representa um avanço significativo na promoção da igualdade e na proteção de grupos historicamente marginalizados. "Ao reconhecer a vulnerabilidade de casais homoafetivos masculinos e de mulheres trans em contextos de violência doméstica, o STF reafirma o compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana e com a erradicação de todas as formas de discriminação", destaca Naumann.
"Essa ampliação é fundamental, pois o direito à segurança não pode depender da identidade de gênero, por exemplo", destaca Naumann. Segundo ela, o preconceito estrutural ainda dificulta o acesso de muitas vítimas à Justiça, e o entendimento do STF é um passo para garantir que nenhuma mulher fique desamparada.
A decisão do STF também aborda a omissão legislativa em relação à proteção dessas populações. O ministro relator, Alexandre de Moraes, enfatizou que "há uma responsabilidade do Estado em garantir a proteção, no campo doméstico, a todos os tipos de entidades familiares".
A realidade dos números
O Brasil tem 391 mil lares formados por casais homoafetivos, de acordo com o Censo de 2022, um aumento expressivo em relação aos 59 mil registrados em 2010. Além disso, um estudo da Universidade Estadual Paulista (Unesp) estima que cerca de quatro milhões de brasileiros se identificam como transgênero ou não-binários. Apesar disso, a violência contra essa população ainda é subnotificada e negligenciada pelo sistema de justiça.
A decisão do STF reconhece que a violência doméstica não se limita a casais heterossexuais e que mulheres trans enfrentam riscos similares às mulheres cisgênero. "Negar a elas o direito às medidas protetivas seria compactuar com um cenário de exclusão e desproteção inaceitável", reforça a advogada.
O que muda na prática?
Com a nova interpretação da Lei Maria da Penha, vítimas de violência nesses grupos passam a ter direito a:
- Medidas protetivas de urgência, como afastamento do agressor;
- Apoio psicossocial e jurídico especializado;
- Atendimento prioritário em delegacias da mulher;
- Maior respaldo para responsabilizar os agressores.
"Este é um avanço que vai salvar vidas", conclui Naumann. "A Lei Maria da Penha é um instrumento de defesa das mulheres – todas as mulheres. O reconhecimento dessa realidade pelo STF traz mais esperança para um país que ainda luta para erradicar a violência de gênero."
Fonte:
Tatiana Naumann é sócia do Albuquerque Melo Advogados nas áreas de Direito de Família e Sucessões e em casos de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, membro da Comissão de Direito de Família (CDF) da OAB/RJ. Também é associada ao Instituto Brasileiro de Direito de Família e membro das comissões de Direito de Família e Sucessões e Direito das Mulheres do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB). Pós-graduada em Direito Processual Civil e em Direito Público e Privado.
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